A bíblia da cretiniceO Antagonista

O Congresso brasileiro, que tem pouco a fazer, está querendo proibir uma metáfora – e com urgência. Foi pautado para apreciação nesta quinta (10) um requerimento para que o Projeto de Lei 2 de 2019 tenha tramitação acelerada no Legislativo. O PL, de autoria do deputado federal Pastor Sargento Isidório (Avante-BA), pretende “proibir terminantemente” que a palavra “Bíblia” seja usada para designar qualquer outra publicação que não seja a do texto sagrado. Assim, chamar um livro técnico muito respeitado de “bíblia da Engenharia”, por exemplo, passaria a ser crime. Ou melhor, dois crimes, segundo a vontade do  pastor sargento: o de estelionato e o de vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso.  

Desconfio que Isidório (e os outros 30 deputados, de todo o espectro ideológico, que assinaram o requerimento de urgência), não esteja, na verdade, preocupado com as senhorinhas de todo o Brasil que chamam o venerável livro de receitas “Dona Benta” de “bíblia da cozinha”.

O que o deixou com ódio, segundo esclarece na justifica do PL, foi a designação de algum livro publicado em 2019, e já esquecido, como “bíblia gay”. O deputado viu nisso uma violência perpetrada contra os cristãos brasileiros. Tremeu também com a possibilidade de algum gaiato chamar de Bíblia, ou até Biblia Sagrada, algum livro com ensinamentos éticos. O sargento Isidório tem a sensibilidade à flor da pele. 

Pastores picaretas criam religiões a torto e a direito no Brasil, com as intenções mais duvidosas e as interpretações mais malucas da Bíblia. Mas isso pode, segundo Isidório e seus trinta apóstolos. E está certo mesmo: a liberdade de religião está prevista na Constituição (a bíblia da sociedade civil). 

Para o pastor deputado, o pecado abominável é usar a palavra bíblia – que etimologicamente vem do grego e significa pura e simplesmente pergaminho ou livro – de um modo que desagrada religiosos histéricos. De modo a banir essa monstruosidade da face da terra, deve-se onerar o Judiciário, transformando juízes em inquisidores. E vade retro, liberdade de expressão 

Custo a crer que o Congresso aprove o PL 2/2019. Caso isso aconteça, o texto não sobreviverá a um exame de constitucionalidade. O projeto do Deputado Pastor Sargento Isidório tem apenas três artigos, uma página de texto. Ainda assim, é a bíblia da cretinice.