O presidente da República, o governo, o Congresso e os partidos podem não se levar a sério, mas o Supremo Tribunal Federal se leva a sério, sim, senhor. O Brasil não é a casa de noca.
A pedido da Polícia Federal, o ministro Alexandre de Moraes ordenou a suspensão do aplicativo Telegram no Brasil por descumprimento de decisões judiciais.
A ministra Rosa Weber negou pedido do Congresso por mais prazo para revelar os nomes de parlamentares beneficiados em 2020 e 2021 com dinheiro do Orçamento Secreto da União.
Foram duas pancadas fortes no sistema de poder bolsonarista. O presidente da República e seus seguidores se refugiaram no Telegram para escapar de punições em outras redes.
Ali, Bolsonaro tem 1.086 milhão de fiéis devotos que migraram do Twitter, Facebook e Instagram que adotaram medidas mais rígidas contra a distribuição de notícias falsas e ataques à democracia.
O Telegram está presente em 53% dos smartphones no Brasil, mas até hoje o Tribunal Superior Eleitoral não conseguiu notificar a plataforma, que não tem sede nem representação aqui.
O Orçamento Secreto é usado por Bolsonaro para a compra do voto de deputados e senadores. Os que atendem aos seus desejos recebem mais dinheiro para obras em seus redutos eleitorais
O dinheiro é público, a identidade dos parlamentares contemplados é secreta. O Congresso queria mais 6 meses de prazo para revelar os nomes. Rosa disse não. Tem que ser já.
Ao saber da decisão de Moraes sobre o Telegram, Bolsonaro, que visitava o Acre em campanha para se reeleger, desesperou-se e esbravejou para uma plateia de encomenda:
“Olha as consequências da decisão monocrática de um ministro do Supremo Tribunal Federal. É inadmissível uma decisão dessa magnitude. Porque ele não conseguiu atingir duas ou três pessoas, que, na cabeça dele, deveriam ser banidas do Telegram. Ele atinge 70 milhões de pessoas, podendo, inclusive, causar óbitos no Brasil, a partir do banimento, por falta de um contato.”.
O medíocre delegado de polícia Anderson Torres, nomeado por Bolsonaro ministro da Justiça para fazer-lhe todas as vontades, correu em Brasília a escrever no Twitter em um português tosco:
“Milhões de brasileiros estão sendo prejudicados repentinamente por uma decisão monocrática. Já determinei a diversos setores do Ministério da Justiça que estudem imediatamente uma solução para restabelecer ao povo o direito de usar a rede social que bem entenderem”.
Poucas horas depois, o russo Pavel Durov, fundador e presidente executivo do Telegram, tirou a escada de Bolsonaro e Torres. Usando seu próprio canal oficial no app, ele desculpou-se:
“Parece que tivemos um problema com emails entre nossos endereços corporativos do telegram.org e o Supremo Tribunal Federal do Brasil. Como resultado dessa falha de comunicação, o Tribunal decidiu banir o Telegram por não responder”.
“Em nome de nossa equipe, peço desculpas ao Supremo Tribunal Federal por nossa negligência. Definitivamente, poderíamos ter feito um trabalho melhor”.
“As últimas três semanas foram sem precedentes para o mundo e para o Telegram. Nossa equipe de moderação de conteúdo foi inundada com solicitações de várias partes. No entanto, tenho certeza de que, uma vez estabelecido um canal confiável de comunicação, poderemos processar com eficiência as solicitações de remoção de canais públicos ilegais no Brasil”.
Até o começo desta manhã, ninguém pelo Congresso disse nada a respeito da decisão de Rosa.